De facto, como diz Celso Lafer, não há raças de um ponto de vista científico, mas, no entanto, o racismo existe e com ele as “raças”. Quem faz a raça é o racismo, como bem demonstra Jean Paul Sartre , na “Questão Judaica” - o judeu não era, antes da II Guerra Mundial, quem se identificava como tal, mas eram os outros que o definiam como judeu. O mesmos se passa hoje em muitas regiões da Europa com os muçulmanos, muitas vezes tão cidadãos franceses, alemães ou holandeses, como os demais, mas vítimas de uma identificação abusiva como 'o' “outro”. É a recusa do que parece diferente, uma forma que os racistas usam para afirmar a sua superioridade e a da pequena comunidade a que eles pensam pertencer.
Numa canção do Tom Waits, os vizinhos olham com desconfiança para um indivíduo “demasiado normal” e perguntam:
“What's he building in there?
What the hell is he building
In there?
He has subscriptions to those
Magazines... He never
Waves when he goes by
He's hiding something from
The rest of us... He's all
To himself... I think I know
Why... He took down the
Tire swing from the Peppertree
He has no children of his
Own you see... He has no dog
And he has no friends and
His lawn is dying... and
What about all those packages
He sends. What's he building in there?
With that hook light
On the stairs. What's he building
In there... I'll tell you one thing
He's not building a playhouse for
The children what's he building
In there?:
Now what's that sound from under the door?
He's pounding nails into a
Hardwood floor... and I
Swear to god I heard someone
Moaning low... and I keep
Seeing the blue light of a
T.V. show...
He has a router
And a table saw... and you
Won't believe what Mr. Sticha saw
There's poison underneath the sink
Of course... But there's also
Enough formaldehyde to choke
A horse... What's he building
In there. What the hell is he
Building in there? I heard he
Has an ex-wife in some place
Called Mayors Income, Tennessee
And he used to have a
consulting business in Indonesia...
but what is he building in there?
What the hell is building in there?
He has no friends
But he gets a lot of mail
I'll bet he spent a little
Time in jail...
I heard he was up on the
Roof last night
Signalling with a flashlight
And what's that tune he's
Always whistling...
What's he building in there?
What's he building in there?
We have a right to know…”
Tony Morrison, no seu lindíssimo livro Paradise, conta a história de uma comunidade negra, que faz da sua identidade pura uma dádiva divina e considera que todos os males que lhe acontecem, nomeadamente uma juventude pouco respeitosa de Deus, não pode vir do seu seio, mas tem de vir ‘dos outros’. ‘Os outros’ neste caso são um grupo de pacíficas mulheres livres que vivem num convento abandonado e aquela comunidade acaba por assassinar…
A resposta a esta paranóia, por vezes assassina, está na “hospitalidade”, ou seja, aceitar o “diferente”, na sua individualidade própria, como igual na nossa casa - a das ideias e da vida quotidiana.
Não há hoje combate mais importante na Europa.